Retomada sem investimento é só festa financeira

A menos que se tenha reinventado a história econômica do mundo, país algum de dimensões consideráveis consegue se desenvolver se não tiver investimentos – e pesados – em infraestrutura e em setores industriais que demandem inversões de considerável tempo de maturação e retorno.

Certo, podem haver exceções quando se trata de países pequeníssimos, onde a intermediação financeira pode gerar receita e, sobretudo, um leque de atividades paralelas que impulsionem a economia e o emprego, mas é preciso uma lupa para enxergá-los num mapa-múndi.

Não é, definitivamente, o caso do Brasil. Aqui, ao longo de décadas, foi o Estado quem fez – diretamente ou financiando – todos os projetos industriais e de infraestrutura. Como é o Estado quem provê crédito para atividades que exigem um perfil mais alongado ou para financiamento sujeito a maiores riscos e flutuações, como o agrícola: perto de 60% das linhas de financiamento estabelecidas como compulsórias pelo Banco Central, operadas hegemonicamente pelo Banco do Brasil e, no caso da aquisição/modernização do maquinário rural e da frota de transportes, quase que totalmente pelo BNDES.

Hoje, no Valor, de onde retiro o gráfico acima, registram-se números que mostram a absoluta impossibilidade de contar-se com os investimentos para que se produza, no médio prazo, qualquer recuperação econômica sólida, fundada na produção e da realidade material da economia.

Os desembolsos do banco, na melhor das hipóteses, fecharão o ano em níveis equivalentes aos de 20 anos atrás, já na fase de declínio do Real. E não se espera muito mais para o ano que vem, embora a muitos pareça que mesmo os 20% de ampliação do crédito de fato ofertado seja uma ilusão, dado o perfil do novo presidente do Banco, Joaquim “Mãos de Tesoura” Levy e a pressão para que se amplie a meta de devoluções do banco ao Tesouro de recursos oferecidos para financiamento.

Talvez esteja aí a dificuldade de indicar o novo Ministro da Infraestrutura, até há pouco dado como certo na figura do general Oswaldo Ferreira, e para o qual fala-se agora em outro general, Joaquim Brandão, antecessor de Ferreira no Departamento de Engenharia do Exército.

Não há muito ânimo em assumir uma batalha com Paulo Guedes, ainda todo-poderoso. Se há uma marca em seu pensamento é aquela dos fundadores da Escola de Chicago, que tem no berço a oposição à intervenção do Estado na atividade econômica, desde as heranças do “New Deal” de Roosevelt e das injeções financeiras norte-americanas na Europa, no famoso Plano Marshall.

O otimismo do mercado não se funda, já se vê desde a assunção de Michel Temer, não é com nenhum tipo de salto à frente na produção e na economia, mas no corte das despesas públicas, na alienação alucinada de nosso patrimônio e nos ganhos rápidos e astronômicos de uma especulação financeira que pouco se importa de estar construída sobre uma economia em ruínas.

PS. Depois de eu ter escrito o post, anunciou-se a nomeação do capitão da reserva Tarcísio Gomes de Freitas para o Ministério da Infraestrutura. Diz ele que haverá ” investimento privado em ferrovias, rodovias e aeroportos”. Sem dinheiro público? Sem nenhum demérito à sua capacidade como engenheiro, acho que este projeto não se sustenta. A vantagem é que, sendo capitão, não precisa ser rebaixado pelo General Guedes.

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8 respostas

  1. Paulo Guedes não quer acabar com o Estado; apenas quer que ele tenha o tamanho mínimo o suficiente para que continue a atender a ele e seus amigos.

  2. São as hienas no final da festa. Eles ssbem que o poder do mundo hoje esta nas mãos da Russia e da China. Esta turma neoliberal acabou querem fazer graça não sei por quanto tempo. O que salvará o ocidente é a união de forças progressistas na Europa e EUA e os partidos progressistas no Brasil PT. Pdt . Pcdob. Mst. Psol. Muita coisa vai rolar nos próximos 6 meses e da América Latina.. Vamos analisar.

  3. Caro Fernando:
    Você disse:
    “O otimismo do mercado não se funda, já se vê desde a assunção de Michel Temer, não é com nenhum tipo de salto à frente na produção e na economia, mas no corte das despesas públicas, na alienação alucinada de nosso patrimônio e nos ganhos rápidos e astronômicos de uma especulação financeira que pouco se importa de estar construída sobre uma economia em ruínas.”
    A UNCTAD – Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, em seu relatório anual, Trade and Development Report 2018 é um quase singular organismo multilateral dedicado aos temas econômicos, que oferece uma visão mais equilibrada e menos contaminada pela ideologia pró-rentista e ” globalista””prevalecente no FMI, Banco Mundial e Organização Mundial do Comércio ( OMC ), órgãos que funcionam, predominantemente, como caixa de ressonância dos interesses hegemônicos centrados no eixo Washington-Nova York-Londres-Bruxelas.
    Nas palavra do secretário-geral da UNCTAD, MukhisaKituyi ” A economia mundial está novamente sob tensão. As pressões imediatas estão se acumulando em torno da escalada de tarifas e de fluxos financeiros voláteis, mas por detrás dessas ameaças à estabilidade global está um fracasso mais abrangente – desde 2008 – de se abordarem as desigualdades e os desequilíbrios do nosso mundo hiperglobalizado(UNCTAD, 26/092018)”……
    Com os riscos de estresse aumentando e as linhas de fratura financeiras se expandindo em vários países, a UNCTAD prevê nuvens de tempestade à frente.
    Por exemplo, o estoque global de dívida atinge a casa de 250 trilhões de dólares – 50% a mais que há uma década. A maior parte desse endividamento vem do setor privado, em particular, o corporativismo, mas o crescimento não se concentra no campo dos investimentos produtivos – desconexão que antecipa problemas” .
    O nosso capitão da reserva e futuro ministro pode ser um bom engenheiro mas demonstra está sonhando alto sem os pés no chão. A não ser que se faça o que se fez no governo FHC, vendeu-se as empresas estatais para os capitais estrangeiros sem que o dinheiro entrasse nos cofres públicos e ainda emprestou dinheiro para esses “investidores”. Paises governados por incompetentes e entreguistas costumam agir assim.

  4. Que eu me lembre, governos da direita, querem o Brasil bem: para empresários, banqueiros, privatizações e por ai vai.
    Para eles o povo é apenas um detalhe.

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