Celso Barros e o partido autoritário de Jair

Para quem está confuso com as intenções de Jair Bolsonaro de montar um partido que, até aqui, parece um aglomerado de fiéis do ex-capitão na direita mais ensandecida e avessa à convivência política – nem os que se elegeram com ele “prestam” e, sem o controle do PSL, o grupo baniu-se do partido – recomendo a leitura do artigo do sociólogo Celso Rocha de Barros, na Folha.

Nem tanto pela conclusão, nem tão difícil, de que ali se forma um núcleo autoritário, onde a ideia de um desmonte da democracia institucional brasileira é o traço comum, mas pela indagação quase afirmativa de que este grupo depende das pautas econômicas selvagemente mercadistas de Paulo Guedes, as quais, ao contrário da tal “Aliança”, ainda encontram ambiente solícito na mídia, no Congresso e, naturalmente, na opinião econômica de direita, na mídia e nas “consultorias” que as alimentam.

Vale a pena, embora a perspectiva seja aterradora.

O Partido Bolsonarista

Celso Rocha de Barros, na Folha

Quando a crise de Bolsonaro com o PSL se acirrou, escrevi que aquele podia ser um ponto de virada no bolsonarismo.

Se Bolsonaro deixasse o PSL e entrasse em um partido democrático normal, como o DEM, sinalizaria que havia se conformado em governar respeitando as instituições. Mas se optasse por fundar um movimento dos bolsonaristas “puros”, deixaria claro que seu plano era destruir as instituições da democracia brasileira.

A decisão de criar a Aliança pelo Brasil, partido extremista que tem como condição de filiação a lealdade cega a Bolsonaro, foi um passo decidido na segunda direção.

Se você supõe que Bolsonaro pretende governar dentro das instituições, gostaria de ouvir sua explicação para a decisão de rachar ao meio o partido do presidente, que empatava com o PT no posto de maior da Câmara.

Bolsonaro fez isso porque quer administrar o presidencialismo de coalizão? Isso facilita a aprovação de alguma reforma? Eu acho que não.

Como no caso de diversas outras medidas de Bolsonaro, ou é golpismo ou é um nível de estupidez jamais visto. E eu não acho que Bolsonaro seja burro.

A APB não faz qualquer sentido como partido de governo democrático. Não tem um único quadro que tivesse qualquer chance de ser nomeado ministro em um governo com padrões higiênicos médios.

Ideologicamente, defende um olavismo “puro” do qual grande parte dos simpatizantes do governo faz questão de se afastar. E, a propósito, terá grandes dificuldades de se legalizar a tempo de disputar as eleições do ano que vem, a não ser que já nasça na base da mutreta.

Mas, como movimento golpista, chega a ser entediante de tão típico. A máquina será administrada por Eduardo Bolsonaro em nome do pai. Filho de ditador com poder chega a ser um clichê. Eduardo não faz segredo nenhum de sua simpatia pelo autoritarismo do governo húngaro de Viktor Órban, e é o representante no Brasil do charlatão vagabundo Steve Bannon.

O deputado federal Daniel Silveira, do Rio de Janeiro, aderiu. Na semana anterior, tuitou que, se precisassem de um cabo ou de um soldado para fechar o STF, ele se oferecia como voluntário. Silveira é um dos marmanjos que rasgou a placa com o nome de Marielle Franco durante a campanha de 2018.

A deputada Bia Kicis, do Distrito Federal, também aderiu. Foi ela quem propôs a revogação da PEC da bengala, que reduziria a idade de aposentadoria dos ministros do STF e copia proposta do governo autoritário da Polônia. E o novo partido responde ao apelo de Olavo de Carvalho para que se formasse uma militância estritamente bolsonarista, que defendesse o chefe em toda e qualquer situação.

Segundo nota publicada no site da revista Época, Bolsonaro quer que os diretórios do partido nos estados sejam controlados por militares. Não facilita em nada ganhar eleição. Mas talvez facilite golpe de estado.

Será uma vergonha, a propósito, se os militares aceitarem colaborar.

Foi a isso que Bolsonaro reduziu a direita brasileira: curso do Olavo, golpe de estado e placas da Marielle rasgadas. Fica aqui, inclusive, minha sugestão para slogan do novo partido.

E é essa a resposta que eu quero e ninguém me dá: se eu apoiar alguma reforma do Guedes, eu estou ajudando essa turma a se consolidar no poder em 2022?

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2 respostas

  1. No último parágrafo, a pergunta de Celso de Barros pode ser direcionada, entre outros, ao próprio jornal que lhe dá espaço.

  2. “E é essa a resposta que eu quero e ninguém me dá…”
    Copidescando:
    “E eis aqui a pergunta que contem a resposta que eu não posso dar…”

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